sábado, 6 de fevereiro de 2016

Saída do D'Ale: Gremistas também disseram adeus

                A despedida de D’Alessandro (relembre) superou qualquer outro fato futebolístico ocorrido na semana. Nas redes sociais foram inúmeras as publicações, especialmente de carinho com o meia argentino. Li vários, praticamente todos que vi. Cheguei a produzir um  e postei nas minhas redes sociais (isso, no caso, Ed Andreick Moreira Wisniewski) e recebi tantos outros pedidos para ver outras produções textuais, conferi todas (ou quase isso).
     Várias crônicas me agradaram, uma inclusive do meu amigo colorado Jaison Argenta (confira), no entanto a que vou publicar para encerrar o assunto é de um gremista. Sim, foram vários artigos de gremistas, artigos altamente bem fundamentados e de uma qualidade incrível, porém o “TCHAU, D’ALESSANDRO”, postado na última quinta-feira pelo competentíssimo Lucas Von Silveira, me impressionou pela sinceridade e por ter “dado o braço a torcer”, assim como revelou os motivos de tal, justíssimos, diga-se de passagem. E, lógico, que os colorados orgulhosos, ao ler o mesmo, também vão se desvencilhar da magoa que sentem de caras como Danrlei, por exemplo. Foi como se fosse uma carta de despedida ao ídolo rival.
     Enfim, sucesso ao D’Ale no River, que seja feliz por Buenos Aires. O futebol brasileiro sentirá sua falta, seja de maneira triste para uns e alegres para outros.

Na íntegra, a crônica de Lucas Von Silveira:

“TCHAU, D’ALESSANDRO

D’Alessandro me irrita. Mas essa é a função dele. Por isso, juro, tem o meu respeito.

Sempre falei: D’Ale é chiliquento. Apita os jogos mais do que jogo. Tem uma voz de criança que não impõe respeito. Suga os cofres do clube. É o D’Alesono. E jogo só quando quer, de preferência perto de Porto Alegre. Mas essa também era minha função.

Na verdade, Andreas D’Alessandro é um dos caras que eu vi jogar que mais entende de futebol. Da essência do esporte. Ele só me irrita por UM motivo: faz tudo certo, mas NO INTER. Só por isso. Se estivesse no Grêmio (quase esteve), todo esse asco, nojo, irritação e ira se transformariam em idolatria. Mas consigo ver, no ser humano que está ali – sem a camisa vermelha, atitudes benéficas ao futebol. Alinhadas ao que eu acredito que seja a essência do futebol.

Talvez alguns gremistas esperassem um texto meu vociferando contra o gringo. Maldizendo sua persona e desejando péssima sorte no River. Pra mim, essa postura não faz muito sentido. Não tenho vontade de despejar veneno contra um cara que joga futebol de forma sanguínea, é fiel a um clube – como poucos são no meio – e sabe da importância que uma torcida tem. Sabe a hora de catimbar e a hora de ir pra cima. Sabe ler um jogo. Sabe ler cenários. Por que devo amaldiçoá-lo agora, que é jogador de um clube argentino? Tudo isso me incomodava só até ontem.

Acho até infantil da nossa parte seguir com a marcação cerrada. Estávamos, todos – nós e ele, fazendo nossos papéis. D’Alessandro saiu do Inter. Acabou o espetáculo. Abandonemos os personagens. Reconhecemos suas virtudes. Busquemos atletas com perfis semelhantes para abrilhantarem ainda mais a nossa própria história. Fingir que ele era só um “anão chiliquento” é mentir pra nós mesmos. Já podemos ser sinceros. Queremos alguém assim. Não gostamos de jogadores ruins e insossos. Queremos os bons e sanguíneos. Qual torcida não quer?

Lembro daquele Gre-nal que o Alan Ruiz destruiu em 12 minutos. Colorados devem agradecer ao D’Alessandro por esse dia: Grêmio fez o 3º gol e o Inter ficou desnorteado. Tonteou. Fizemos o 4º no embalo, logo em seguida. Colorados nem entenderam o que estava acontecendo. Eis que o chiliquento dá um chilique. Vai pra cima do seu conterrâneo gremista e arma uma confusão. O jogo para. Grêmio perde o “flow”. Ânimos arrefecidos. Partida volta a ficar morna. Era pra ser 6x1 aquele jogo. Talvez até um cabalístico 7x1 (com Felipão, imagina). Foi “só” 4.

E nos 5x0 de 2015? D’Alessandro não estava. Se estivesse, ia armar confusão depois do 3º gol, gritar com os companheiros, enfim, faria o possível para quebrar nosso ritmo. E provavelmente conseguiria. Dificilmente chagaríamos aos 5. Pelo menos tenho essa impressão.

Preferi usar dois exemplos felizes para falar do tamanho desse cara. Até em derrotas retumbantes tem importância para o time. Até em ausências é lembrado. Isso é irritante. E estou falando de um 9x1 para o Grêmio no agregado. Fora outras lembranças que prefiro não evocar.

‘Ah, mas ele provocava o Grêmio’. Perfeito. Era a função dele. Não estava no papel de “mais um jogador isosso”. Transcendia ao profissional. Era quase uma extensão do torcedor em capo. Respondia cornetas com mais cornetas. Igualzinho ao Danrlei, Renato e tantos outros (na verdade, nem tantos). Igualzinho a nós, torcedores. E por isso nos irritava tanto. Mas estava apenas cumprindo o seu papel. Mantendo o respeito e a civilidade, mas botando lenha na fogueira. O futebol agradeceria se mais colegas de profissão cumprissem o mesmo papel.

Grêmio. A gente criou casca. Não é qualquer Sasha que vai nos intimidar ou tirar do sério. Mais que isso: D’Alessandro é a escuridão. D’Alessandro é um símbolo do nosso período de ostracismo. D’Alessandro é tudo que mais repudiamos. Graças a ele, nossas próximas glórias serão mais lindas, mais intensas. Só existe luz porque existe escuridão. Só existe bonito porque existe o feio. As vitórias só lavam a alma porque as derrotas sujam. Ser Campeão do Mundo todo ano seria cansativo. Mas quando não se ganha quase nunca, no dia que se ganha, se extravasa.

Em outras palavras, o bom da Era D’Alessandro pra nós, gremistas, é que ela um dia acaba. E acabou. Nosso rival não ter mais um para-raios para canalizar crises. Uma bússola para nortear o time em meio a tempestades. Um carrasco para passar o machado em nossas cabeças quando já estamos rendidos. Acabou. O Inter voltou ao normal. Um time normal, com a grande maioria. Sem esse cara irritante de fala fina.

Dito isso, que venha a Libertadores 2016. E que o Grêmio pegue o River. E que fique atento a um camisa 10 deles que vai querer apitar o jogo. E que o Roger oriente nossos meninos para que não sejam intimidados pelo capitão gallina. E que não deixem ele cortar pra esquerda na entrada da área. E que o jogo decisivo seja na Arena: pois aqui, ele sabe, o furo é mazembaixo.

Tchau, D’Alessandro. Vai ser feliz. Longe daqui.
 Saudações azuis, pretas e brancas,
@lucasvon.”

- Mais textos de Lucas Von Silveira, em medium.com/@lucasvon.

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